Este sábado, um pequeno país representativo de menos de 1% da população da União Europeia, fez tremer todas as chancelarias da Europa unida. O não irlandês, é mais um entrave ao processo de concretização de uma nova estrutura decisória no âmbito da união que, vem a evoluir desde a fundação da Comunidade Europeia. Reformular o quadro institucional e decisório vigente, foi o objectivo da tão chamada “Constituição Europeia” chumbada em referendo pelos holandeses e pelos franceses. Gorada a tentativa de impor na Europa um instrumento jurídico típico de um Estado Federal, uma Constituição, procurou-se reformular o Tratado já existente que, para a maioria dos analistas, nada mais se tratou do que fazer meras alterações formais e não substanciais, mas que apesar de tudo tranquilizou aqueles que temiam uma espécie de “Estados Unidos da Europa”.
Devido ao chumbo por referendo da “Constituição Europeia” na Holanda e na França, os vários executivos europeus procuraram evitar a sujeição do Tratado de Lisboa a um referendo interno, como forma de rectificação do tratado nos seus respectivos países. Há nesta atitude dos governantes europeus um medo legítimo de que o referendo ao Tratado de Lisboa seja usado para contestar os Governos nacionais e a respectiva conjectura económica e social em que esses países vivem. Assim, tal referendo não se iria debruçar sobre questões atinentes ao Tratado e à própria Comunidade Europeia, mas sim a aspectos da vida política interna.
Na Irlanda, tal como acontecera na França e na Holanda, a vitória do NÃO é resultado de um descontentamento social contra políticas internas, sendo em certa medida um voto de protesto contra as autoridades políticas nacionais. No caso irlandês, o forte conservadorismo da sua população também beneficiou a campanha pelo NÃO que, sob o comando de SLOGANS populistas, como aquele que se dizia que o Tratado de Lisboa iria obrigar a Irlanda a despenalizar o aborto, conseguiu obter votos também contra a Europa.
Continuando na Irlanda, é de estranhar o euro cepticismo da sua população que já se tinha revelado no chumbo em referendo do Tratado de Nice em 2001. Convém sublinhar que este pequeno país foi um forte beneficiário de fundos estruturais provenientes de Bruxelas, considerados pelos analistas como a base para o desenvolvimento irlandês que, ao contrário de Portugal, assentou primariamente na Educação e só depois no Betão. Recorde-se que a Irlanda, graças à Europa e à sua entrada na Europa, passou de país pobre e subdesenvolvido para um pais que apresenta uma das mais altas taxas no índice de desenvolvimento humano em todo o Mundo, estando mesmo à frente da sua outrora potencia colonizadora (em termos físicos e mais tarde económicos) Inglaterra (Reino Unido), de quem paulatinamente se tem vindo a autonomizar em termos económicos graças à sua entrada no Euro.
Pessoalmente, fui favorável a decisão do nosso Governo em não referendar o Tratado de Lisboa. Em bom rigor, sou contra Referendar tratados Europeus. A minha opinião, não assenta nas razões apontadas pelos Governos Europeus para não referendarem tais questões. O medo do referendo à Europa como forma de “chantagem política”, como meio de voto de protesto à política e aos governos nacionais, como protesto à conjectura económica a social do país, são razões atendíveis para não se referendar o projecto europeu, mas não são os essenciais.
Aqueles que defendem a feitura de Referendos aos projectos europeus, devem em primeiro lugar proporcionar aos cidadãos a informação necessária para que estes compreendam o projecto europeu, como ele irá ser desenvolvido e continuado no futuro. É necessário que o Europeu comum, compreenda o que é a União Europeia e quais sãos os seus objectivos, as suas instituições, a sua forma de funcionamento e as suas perspectivas de futuro. Só quando acabarmos com o divórcio existente entre o Europeu comum e a União Europeia é que os cidadãos europeus poderão ponderadamente dizer de sua justiça em relação ao futuro desta União. Quando chegarmos a este estádio, em que os europeus se envolveram com a construção europeia e em que esta aparecerá como algo que lhes diz também a eles respeito e não só aos governos quando reunidos em Bruxelas, os actuais receios dos vários Governos na realização de referendos estarão ultrapassados.