O número de países que consagrou já o casamento entre pessoas do mesmo sexo aumentou este mês, com a entrada da Noruega para um rol que inclui a Espanha, a Holanda, a Bélgica, o Canadá e a África do Sul (mais o Massachusetts e a Califórnia, nos EUA). Em Portugal, porém, o debate mal começou - e quando sucede, é comum ouvir argumentos tão elevados como "se se permitir o casamento entre homossexuais, porque não o casamento com animais?". Politicamente, adia-se o assunto com a chancela do "fracturante" e o "há outras prioridades". Juridicamente, e apesar de a questão estar pendente no Tribunal Constitucional, pouco se tem discutido. Até agora: três dos pareceres que junto do TC defendem a inconstitucionalidade do Código Civil no que respeita aos artigos 1577.º (define o casamento como "contrato celebrado entre duas pessoas de sexo diferente") e 1628.º (considera nulo o casamento de pessoas do mesmo sexo) foram publicados em livro pela editora Almedina. Da autoria de Carlos Pamplona Côrte-Real, Isabel Moreira e Luís Duarte d'Almeida, o volume, lançado esta semana, permite antes de mais conhecer as características jurídicas do casamento, aspecto fundamental no debate, e prossegue na demonstração da inconstitucionalidade dos dois referidos artigos. Acessíveis a não juristas pela linguagem e pela explicitação clara das questões, os três pareceres permitem a qualquer leigo entender que a proibição em vigor está longe de ser fácil de defender, com seriedade, do ponto de vista jurídico, até porque a própria definição do casamento na lei em vigor está longe de ser clara. Afinal, como sublinham os autores, o Código, ao mesmo tempo que define, no citado artigo 1577.º, o casamento como "contrato celebrado entre duas pessoas de sexo diferente que pretendem constituir família mediante uma plena comunhão de vida", permite, no artigo 1622.º, o casamento in articulo mortis (celebrado quando um dos nubentes está à morte). Dito de outra forma, alguém se casa para ser viúvo ou viúva de alguém - e lá se vai a ideia de "comunhão de vida" e de "constituição de família". De resto, os pareceres chamam a atenção para o facto de, ao contrário do que é comum argumentar-se, não existir qualquer relação obrigatória entre casamento e procriação (nada impede o casamento de duas pessoas com cem anos, ou inférteis). E vão mais longe: lembram que "contra direitos fundamentais não valem, sem mais, maiorias". Uma afirmação corajosa, que no caso adquire um travo peculiar. Apesar da sua óbvia qualidade e do seu evidente interesse e actualidade, dois destes pareceres, propostos para publicação na revista do Ministério Público (editada pelo sindicato dos respectivos magistrados), foram recusados com argumentos como "não é oportuno" e "seria preciso existir contraditório". Salvo melhor parecer, trata-se do silenciamento de opiniões jurídicas que contestam o statu quo. Que quem o faz tenha por função institucional defender a legalidade democrática - e portanto a Constituição - torna o gesto ainda mais significativo: uma causa com tantos e tão poderosos inimigos, que suscita tanto mal-estar e desperta tantos pudores, só pode ser tudo menos desprezível.
Fernanda Câncio, in Diário de Notícias
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